quinta-feira, 29 de maio de 2008

A Estratégia da Sedução

Durante vários séculos, os homens não precisaram se preocupar muito com a sedução. A "conquista" de uma mulher se fazia pela força - ou por contratos e acordos. Com a esposa devidamente cativada - sempre às voltas com as ocupações domésticas e a criação dos filhos - desaparecia qualquer necessidade de encantamento, se é que isto tenha chegado a existir um dia.

Coube à mulher, para se defender da brutalidade e da ingerência de outros em sua própria vida, desenvolver a sedução como uma arte sofisticada, a forma mais avançada de persuasão e poder. Não físico, mas psicológico. Não de maneira direta e ostensiva, mas com sutileza e astúcia. Cleópatra é o exemplo emblemático: seduziu Júlio Cesar e, depois, Marco Antônio para preservar seu império.

Por volta do século 18, sobretudo em razão do brilho e da importância adquiridos pela vida na Corte, os homens passaram a se interessar pela sedução, como forma de conquistar mulheres jovens. É o período em que se destacam Duque de Lauzun, Casanova (foto) e Don Juan, como grandes sedutores e amantes, versados na arte de fascinar, irresistíveis em seus avanços e estratagemas.
De 1800 em diante, a sedução sobrepuja a relação amorosa e ganha uma dimensão social e política. De qualquer forma, o fenômeno havia sido antecipado na França, no final do século 17, pelo fantástico trabalho de construção da imagem de Luís XIV, o Rei Sol, ainda que de forma limitada pela sociedade da época e pelos recursos técnicos disponíveis.

A partir do século 19, entretanto, políticos e governantes descobriram que a sedução também podia ser exercida em grande escala, especialmente com as massas populares. Napoleão foi, talvez, quem melhor e mais cedo percebeu tal possibilidade e a desenvolveu.

Naquela época, a conquista apoiava-se, basicamente, num tipo de oratória coadjuvada pelo uso inteligente de símbolos - enormes espetáculos e recursos teatrais criavam uma atmosfera carregada de importância e grandeza, em torno da presença física do líder.

O ato político cortejava os ouvidos e a mente (discurso) e os olhos (espetáculo), de maneira a emocionar, envolver e cativar os participantes - a mis-en-scène do carisma.

Ao seduzir as massas, os líderes ganhavam poder sem precisar usar a força. Isto porque a essência da sedução é - como sempre foi - um "jogo psicológico" e não de beleza. Seduzir é usar a gratificação e o prazer como "iscas", manipular as emoções do outro, estimular o desejo - e também a confusão e a incerteza sobre como realizá-lo - e induzir a rendição. Em outras palavras, um "jogo de poder". Os sedutores entendem o enorme potencial contido no ato de entrega à sua vontade. Uma pessoa "apaixonada", por um amante ou por um líder, é alguém que age emocionalmente, que rebaixou seu senso crítico a ponto de eliminá-lo, tornando-se muito sugestionável e facilmente conduzível.

A sedução é, pois, a forma consumada de poder. Os que a ela se submetem, o fazem livremente, com felicidade e de boa vontade. Eles perdoam as desilusões e a manipulação, encarregando-se de encontrar razões que as justifiquem. Os princípios são basicamente os mesmos, tanto na sedução amorosa, quanto na política. Os grandes sedutores não eram e não são, necessariamente, pessoas fisicamente bonitas e atraentes. Entretanto, possuem um "charme" envolvente e irresistível. Sabem criar um clima intrigante em torno de si, são exímios em demonstrar atenção e interesse pela criatura mais importante para você, isto é, você mesmo, e são capazes de transportar as pessoas de sua realidade prosaica para um projeto grandioso, um mundo novo, uma aventura gloriosa.

Nem Napoleão, nem Hitler, nem Mussolini, nem De Gaulle, nem Stalin podiam ser considerados fisicamente atraentes e bonitos. Muito ao contrário: alguns equilibravam-se com muita dificuldade para não serem vistos como ridículos, outros para não serem encarados como banais. Todos eles, entretanto, sabiam administrar o seu "carisma" com muito zelo.

Benito Mussolini: combinação do discurso ultranacionalista, dos gestos teatrais e da ambientação grandiosa seduziu multidões na Itália na metade do século 20

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Cultivavam um mistério sobre suas vidas pessoal e familiar, despertando curiosidade e especulação; vestiam-se de maneira diferente; possuiam uma oratória ajustada a sua época e ao seu público; lançavam mão de espetáculos grandiosos e impactantes, para magnificar sua importância; tinham gestos peculiares, que revelavam força, determinação e coragem; manifestavam preocupação, interesse e dedicação aos governados e à nação; apresentavam suas decisões, invariavelmente, como expressão do interesse nacional; incorporavam a suas imagens atributos como abnegação, amor à pátria, sacrifício, heroísmo e idealismo.

E não foram apenas governantes totalitários - como Hitler, Stalin e Mussolini - que desenvolveram e exerceram a arte de seduzir o povo. Os líderes democráticos também o fizeram e fazem: o próprio De Gaulle, na França, Kennedy, nos EUA, e Collor, no Brasil, são alguns exemplos dessa habilidade.
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